terça-feira, 26 de abril de 2011

Entrevista sobre o programa social Doutores Cidadãos, do Canto Cidadão

 
1 - Qual a receptividade dos hospitais com o trabalho que vocês oferecem e desenvolvem?

CC- Atualmente a receptividade é bastante boa, com poucos casos de ocorrências negativas. No início do trabalho há quase 10 anos enfrentamos algumas dificuldades em função da característica que nos propusemos, ou seja, um foco nos pacientes adultos e idosos, assim como nos profissionais da saúde. Mas com o passar do tempo, os hospitais perceberam que havia espaço para trabalharmos com visitas animadas feitas por voluntários palhaços junto ao público que escolhemos. Creio que a percepção que o hospital tem de que o voluntário do Canto Cidadão está preparado (em função do tratamento) ajuda bastante na boa receptividade. Para você ter uma ideia, existem vários hospitais que estão aguardando a formação de mais voluntários para receber as atividades, o que demonstra que há um interesse crescente por esse tipo de iniciativa. 

2 - Quais são as principais dificuldades que vocês encontram para esse trabalho? 
CC- As principais dificuldades estão relacionadas à regularidade das visitas dos voluntários. Enfrentamos regularmente as chegadas e partidas de voluntários, uma vez que situações muito diversas podem ocorrer na vida deles que os fazem se afastar temporária ou definitivamente. Alguns exemplos: mudança de cidade; mudança de emprego e acréscimo súbito de responsabilidades; nascimento de filho; doença séria na família; momento de fragilidade emocional; além desses motivos, ainda existem aqueles voluntários que chegam à conclusão de que preferem investir seu tempo em outras ações sociais, pois sentem que já entregaram o que podiam e queriam com o nosso programa social.
Em termos de recursos financeiros a organização consegue se manter sem patrocínios externos porque trabalha com uma estrutura enxuta e também investe na auto sustentabilidade. Fazemos isso por meio da prestação de serviços para empresas, especialmente palestras, oficinas e assessorias para implementação do trabalho voluntário junto aos funcionários das empresas.
Como eu disse na resposta anterior, os hospitais não oferecem duras resistências ao trabalho. Na maioria absoluta dos casos temos uma relação saudável e parceira com os hospitais e seu corpo de profissionais. Voltando ao primeiro parágrafo da resposta, o que gera mal estar com o hospital é quando o voluntário não cumpre com o que se comprometeu, pois gera uma frustração em todos os envolvidos. Portanto, nosso maior desafio é manter a regularidade dos voluntários, oferecendo-lhe treinamento e apoio (inclusive emocional) no máximo que conseguimos.

3 - Como vocês envolvem o publico geral?
CC- O envolvimento se dá pela boa e velha aproximação respeitosa. Como atendemos adultos e idosos preferencialmente, os voluntários possuem algumas atitudes que conquistam a permissão de se aproximar de todos os públicos que você apontou. Antes de querer fazer shows em hospitais, queremos fazer amigos. Os principais instrumentos são a conversa interessada, bons ouvidos e respeito profundo ao paciente, acompanhante e profissionais. De uma forma carinhosa, respeitosa, interessada e alegre, os voluntários temperam com bom senso o momento da aproximação. Com os profissionais, sempre buscamos interagir no momento da chegada ao andar, por exemplo. Além de buscar "colorir" o momento com eles, também pedimos indicações de pacientes que estejam mais precisando. Isso gera um respeito mútuo, um sentimento de pertencimento à equipe. Com os acompanhantes e pacientes funciona de forma parecida, pois chegamos com jeito, buscando conhecer as pessoas que ali estão, apresentando o motivo de nossa visita, puxando assuntos que podem construir um clima legal. E depois pratica a escuta interessada e o papo alegre, que envolve a todos quanto feito com sinceridade e respeito.Não nos valemos muito de esquetes prontas, shows, aparatos e outras ferramentas. Vez por outra até os utilizamos, mas o principal é aproximar e envolver pelo bom papo, que acaba se tornando uma declaração de interesse pelo bem estar do outro.


4 - Na sua opinião, o que você acha dessas atividades dentro dos hospitais?
CC- Eu entendo que essa atividade tenha uma função essencial em quaisquer locais da sociedade, uma vez que é uma produção em alto nível de bons encontros humanos. Olhando para a sociedade e a comparando a um hospital, percebo que temos o grande desafio de compreender os nossos papéis constantes, em tempo integral mesmo, de cuidadores e pacientes. Transitamos entre essas duas posições o tempo todo, seja em casa, trabalho ou âmbito social. Desenvolver a capacidade de cuidar melhor para ampliar a chance de ser melhor cuidado é o grande desafio da humanidade. Para tanto, romper com a anestesia comportamental, ou ainda, com a indiferença paralisante, é condição básica. A atividade que fazemos nos hospitais, além de promover bons encontros no ato, naquele momento em que há tanta fragilidade e necessidade de acolhimento, também é capaz de gerar em todos os envolvidos (voluntários, pacientes, acompanhantes e profissionais) um aprendizado na arte dos bons encontros. Nossas esperança constante é que a atitude empática que adotamos nos hospitais reverberem também no dia-a-dia de quem a experimenta, "contaminando" todas as searas da vida. Fico muito motivado quando penso na possibilidade infinita de aprimoramento dos bons encontros. 


5 - Na sua opinião qual a importância do riso e da alegria para o paciente?
CC- O riso e a alegria são expressões naturalmente humanas. Penso que são necessidades básicas em termos fisiológicos, sociais e sentimentais. Quando nos privamos dela, atrofiamos estruturas essenciais de bem estar e também de cura. A ciência já comprovou isso em inúmeras pesquisas, e o nosso trabalho oferece provas constantes da importância do riso e alegria para as diversas saúdes do indivíduo. É impossível definir aritmeticamente o quanto pode contribuir com a cura, mas estou cada dia mais certo no poder dessas expressões humanas, tanto para a prevenção quanto para a resolução. Ou, numa situação limite, praticar o bom humor pode reduzir o sofrimento em um momento em que a medicina não pode oferecer mais nada ao paciente.  


6 - Todos os pacientes participam dessas atividades?
CC- O objetivo é visitar todos os pacientes, inclusive aqueles que estão inconscientes. Para estes últimos, nós deixamos mensagens, pois cremos que de alguma forma elas ajudarão. Claro que o atendimento a todos os pacientes em todas as visitas dos voluntários é quase impossível, pois há hospitais com muitas centenas de pacientes. Mas, em termos gerais, não há restrição absoluta. Até em quartos com isolamento nós entramos, muitas vezes com todo o paramento necessário para não haver risco de contaminação para nenhuma parte.


7 - Fale um pouco sobre o Canto Cidadão e suas expectativas para com os pacientes.
CC- O Canto Cidadão tem a expectativa de sensibilizar pessoas para a importância dos bons encontros, como eu já disse anteriormente. Junto aos pacientes, queremos oferecer visitas que deixem claro a existência de pessoas que se preocupam de verdade com a condição humana, e estão dispostos até a se vestir de palhaços (rs), atravessar a cidade e visitar um hospital público para se colocar à disposição de um desconhecido. É essa a natureza maior do que fazemos: bons encontros, empatia, solidariedade compartilhada, saúde na sua essência mais básica. Repito: não desejamos fazer show nos hospitais, mas sim fazer amigos. E que essa busca se torne uma constante na vida dos voluntários e de todos que cruzem o seu caminho.



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